05.10.2012 | Texto por
Nome: Céu - Idade: 32 anos -
Profissão: cantora - Medo de envelhecer: “Ficar surda” - O que fez com o
1º cabelo branco: “Arranquei, mas o segundo deixei por medo de que
viessem outros”
Em uma pesquisa realizada pelo
Datafolha em dezembro de 2011 em São Paulo, quase metade dos
entrevistados entre 16 e 25 anos confessou ter medo da velhice. Entre os
maiores de 56 anos, no entanto, apenas um quarto admitiu sentir o
mesmo.
Para entender por que o medo e as expectativas em relação à velhice começam tão cedo, Tpm
ouviu mulheres de perfis diferentes: a cantora Céu, 32 anos, a atriz
Isabel Wilker, 27, a jogadora de vôlei Jaqueline Carvalho, 28, e a chef
Renata Vanzetto, 24. Falaram de perdas e ganhos, rugas, trabalho, família e do “fim” – a
morte ainda é um tabu poderoso.
O Brasil é campeão mundial em cirurgia de pálpebras. No Botox, perdemos apenas para os Estados Unidos
Jovens, elas são o retrato da
geração que investe em beleza preventiva, amparada pela oferta de
produtos e pela orientação médica. Segundo o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), os brasileiros vivem 25,4 anos a mais
hoje do que em 1960. Mas, a julgar pelo boom de intervenções estéticas, é
como se não tivessem se acostumado à nova realidade. O país é o número
um do mundo na blefaroplastia, cirurgia que tira a pele envelhecida das
pálpebras, e também no enxerto de gordura no rosto, usado para preencher
rugas. Os dados, da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica
Estética (Isaps), mostram também que, no uso da toxina botulínica,
ficamos atrás apenas dos Estados Unidos. Para a Sociedade Brasileira de
Dermatologia (SBD), não há restrições para a aplicação do Botox a partir
dos 30 anos – seu uso “preventivo” tenderia a ser mais eficaz do que
aplicações iniciadas aos 40.
Mesmo quem não procura fazer o
impossível, parar a natureza, tenta atenuar os efeitos do tempo. Renata,
nascida e criada na praia, não toma mais sol sem protetor. Por outro
lado, se apoia no metabolismo acelerado para comer até quatro porções de
chocolate por dia. Daqui a dez anos, ela sabe, o corpo pode não
aguentar o mesmo ritmo. “Minha mãe não come carboidratos à noite há mais
de 20 anos. Sinto que um dia também farei sacrifícios.” Jaqueline e
Isabel usam creme antissinais desde que completaram 25 anos. Céu tenta
preparar o espírito para a mudança de visual. “Aos 40, espero estar de
bem com as minhas ruguinhas”, diz. O que, em especial num país como o
Brasil, não é tarefa assim tão fácil.
“Torço pela sabedoria de enxergar o melhor foco para cada momento” Céu, cantora
“A juventude aqui é apresentada
como a verdade através da qual se consegue visibilidade, estima e
aceitação social”, explica o psicanalista e professor da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Sócrates Nolasco. O que agrava o
quadro, segundo ele, é a falta de postura crítica do brasileiro. “Somos
incapazes de relativizar as cobranças que recebemos da publicidade, e
buscamos sempre a aceitação do grupo”, diz. “O brasileiro sozinho é
malvisto e, por isso, passa maior parte do tempo dentro de algum grupo. A
demora para se emancipar emocional e financeiramente da família
colabora para que [as pessoas] não aprendam a ter opinião própria.”
Alex Batista
Nome: Isabel Wilker - Idade: 27
anos - Profissão: atriz - Medo de envelhecer: “Não me tornar uma grande
atriz” - O que fez com o 1º cabelo branco: “Não dei bola”
Limites da medicina
Talvez as coisas estejam começando
a mudar. Em julho deste ano, o Conselho Federal de Medicina emitiu um
parecer em que não reconhece terapias antienvelhecimento que se utilizam
de hormônios. O argumento é que esses tratamentos – que usam
testosterona, cortisona, melatonina – não têm benefícios comprovados e
trazem riscos aos pacientes. No texto, além de causar um revés
importante em um tratamento que vinha se popularizando no Brasil, o
conselho foi além e lembrou: “O envelhecimento é uma fase do ciclo
normal da vida, não devendo ser considerado doença que necessita
intervenção medicamentosa”.
Ainda assim, os consultórios de
dermatologia estão lotados de pessoas querendo parar a ação do tempo. E a
especialidade cresce em ritmo acelerado. De 2010 para 2011, a procura
pelo teste que confere o título de dermatologista cresceu 40%, segundo a
Sociedade Brasileira de Dermatologia. Um levantamento feito pela
entidade mostra que a grande maioria de seus membros atende à demanda
por juventude: 84% aplicam toxina botulínica em seus consultórios. O
Botox é o tratamento mais popular para atenuar o envelhecimento cutâneo
no Brasil, seguido de preenchimento com ácido hialurônico e laser. A SBD
orienta os médicos a sugerir intervenções apenas depois de ouvir a
queixa do paciente. Na prática, não é sempre isso o que acontece.
A antropóloga Mirian Goldenberg
sabe como é isso. Aos 40 anos, ela foi pela primeira vez à
dermatologista querendo orientações sobre hidratação e proteção contra o
sol. Lá, ouviu uma lista de defeitos que não enxergava em si mesma.
“Ela me sugeriu preenchimento ao redor dos lábios, Botox na testa e
correção nas pálpebras. Eu não via nada daquilo no meu rosto!”, lembra.
Nos seis meses que se seguiram à consulta, Mirian entrou em crise – e
depois a superou, sem ter feito nenhuma intervenção no rosto.
“O botox diminui o ritmo do envelhecimento, só. A ideia nunca é ter 50 e parecer 20”, Bruna Felix Bravo, dermatologista
Outro aspecto em que teoria e prática diferem é o momento certo de parar. “[O Botox]
apenas ajuda a diminuir o ritmo do envelhecimento. A ideia nunca é ter
50 parecendo 20”, afirma a dermatologista Bruna Felix Bravo,
coordenadora do Departamento de Cosmiatria da Sociedade Brasileira de
Dermatologia – Regional Rio de Janeiro. Mas, como a decisão obedece a
uma vontade estética, exageros são comuns mesmo com orientação médica.
“Não gostaria de ser uma dessas pessoas que lutam com força contra os
anos”, afirma a cantora Céu. “Elas não ficam com cara de mais novas. Só
ficam com cara de quem está lutando.”
Essas senhoras da revolução
botulínica de que Céu fala são um elemento novo no cenário urbano
brasileiro. Mas, se as injeções semestrais podem trazer satisfação
pessoal a mulheres desgostosas de suas rugas, elas são vistas com
ressalvas por quem estuda o assunto.
É o caso da antropóloga Andrea
Lopes, doutora em gerontologia e coordenadora do grupo Envelhecimento,
Aparência, Imagem e Significativo, da Universidade de São Paulo (USP).
“Faltam imagens reais e, principalmente, diferentes umas das outras”,
pontua. Em vez de diversidade, temos uma bipolarização. Até a década de
70, ser velho era sinônimo de decadência, doença, asilo. Aí, no final do
século 20, surge uma imagem superpositivada, dos velhinhos que podem
tudo. São duas inverdades cruéis com quem tem de envelhecer”, diz.
Essas pessoas que têm de
envelhecer, no caso, são todas. Você, eu, todo mundo. Por mais difícil
que pareça. Num encontro de amigas, a jogadora Jaqueline quase jogou um
celular longe quando uma delas incluiu sua foto em um aplicativo que
envelhece retratos. “Eu aparecia grisalha, cheia de rugas. Saí gritando
‘tira isso da minha frente!’.” Por mais que recuse essa imagem, Jaque
não sabe ao certo como vai encarar a mudança no rosto. Se espelha em
Luiza Brunet (leia a entrevista nas Páginas Vermelhas), mas reconhece
que ela é exceção.
“Temos duas imagens irreais: a da decadência e a dos velhinhos que podem tudo”, Andrea Lopes, antropóloga
De fato, o modelo da maturidade é
algo que precisa ser reinventado. “Inclusive porque as pessoas que estão
entrando nos 60 anos cresceram num mundo que exaltou a juventude. Elas
não são um bom exemplo de como lidar com o tempo”, lembra Andrea. A
exaltação a que se refere é a de ícones como os Beatles e Elvis Presley,
de bordões como “Não confie em ninguém com mais de 30”, “O Brasil é o
país do futuro” e da revolução dos costumes, movimentos em que os jovens
encamparam o poder e transformaram pais e avós em imagens a não ser
seguidas.
Alex Batista
Nome: Jaqueline Carvalho -
Idade: 28 anos - Profissão: jogadora de vôlei - Medo de envelhecer:
“Perder a mobilidade” - O que fez com o 1º cabelo branco: “Pintei”
Novas velhas
Uma maneira de encarar a questão,
para muitas mulheres jovens, é procurar uma nova relação com a passagem
do tempo. “Penso muito no assunto”, diz Céu. “Será que vou entender a
hora de parar de fazer música? Será que vou querer curtir meus netos?
Torço pela sabedoria de enxergar o melhor foco para o momento”, afirma.
Mesmo assim, os receios vêm junto. “Tenho medo de ficar surda, porque
uso o fone in-ear e, quando o técnico erra, o som estoura dentro do
ouvido. Também tenho medo de ter vícios de comportamento, de me tornar
ainda mais esquecida do que sou.” Para Isabel Wilker, a aflição é
profissional. “Tenho medo de chegar aos 50 e ver que não fui a boa atriz
que quero ser.”
O receio tem a ver com a fase
atual da carreira. Há dois anos, ela decidiu seguir a profissão dos
pais, os atores José Wilker e Mônica Torres. Está feliz com a decisão,
mas se pergunta se não veio atrasada. “Bati o martelo com 25 anos,
enquanto colegas estão na profissão desde os 18. Para alguns papéis, já
sou velha”, conclui ela, que se formou em letras, iniciou um mestrado na
área, foi modelo e apresentadora e fez cursos de interpretação em
Londres. Aos 27, vê que o tempo de indefinições está chegando ao fim. “É
como se você passasse a ter menos espaço de manobra”, afirma. E, ao
mesmo tempo, sem poder olhar para trás e enxergar realizações
importantes. “Fico nervosa”, solta, cerrando os dentes.
“Para alguns papéis, já sou velha demais. Às vezes me sinto atrasada”, Isabel Wilker, atriz
Sentir-se velha bem antes de sê-lo
é algo que Jaque conhece bem. Por causa da carreira curta que o vôlei
proporciona, a atleta precisa pensar, antes dos 30, na sua
aposentadoria. “Estou mais perto do fim do que do início. Se sofresse
uma contusão agora, teria que repensar o esporte”, pondera.
A antropóloga Mirian Goldenberg
aprofunda seus estudos no intervalo que existe entre a “era de ouro” dos
20 anos e a morte. E, se tudo der certo, ele pode ser grande. “Minha
próxima pesquisa é sobre os aspectos positivos do envelhecimento. Os
negativos existem, mas já foram muito abordados”, conta. Ela identificou
que a fase dos 30 aos 50 é a mais sofrida para a mulher, nesse quesito.
“Se ela tem 35 e quer ter filhos, sofre muito. Depois, aos 40, vê que
passou a vida investindo no corpo e, de repente, se sente invisível. Já
depois dos 50, vejo uma queda grande na frustração”, explica. Um dado
inédito dessa pesquisa, no entanto, surpreende. “Quando pergunto para
homens e mulheres de todas as idades quem envelhece melhor, todos
respondem: ‘Os homens’. Mas hoje um grupo está discordando disso: são as
mulheres de 60! Elas chegam lá e veem que estão ótimas, bem cuidadas,
ativas, felizes, olham para o cara do lado e não o acham tão bem assim.
Esse dado é revolucionário!” Estudando o tema há seis anos, a
antropóloga criou uma espécie de manifesto pessoal contra a neura de
envelhecer. “Se você vai viver até os 90 e começa a sofrer aos 20, pense
bem...”
Alex Batista
Nome: Renata Vanzetto - Idade:
24 anos - Profissão: chef de cozinha - Medo de envelhecer: “Engordar” - O
que fez com o 1º cabelo branco: “Não apareceu ainda”
A proximidade do fim
Isabel cresceu ouvindo a mãe dizer
que envelhecer era uma droga, mas que a alternativa (morrer) era bem
pior. Mesmo assim, só começou a pensar no assunto depois que a ideia da
morte deu uma trégua. “Quando tinha 4 anos, um amiguinho morreu num
acidente de carro. A partir dali, por anos, achei que fosse morrer a
qualquer hora. Estava convencida de que não ia dar tempo de envelhecer”,
lembra. Só depois de muita psicanálise, iniciada na infância, ela
passou a entender que tem mais tempo para viver. E precisa, agora, lidar
com ele.
Na vida da chef Renata, ao
contrário, a morte entrou de supetão. Ela não pensava muito na finitude
até que, em abril deste ano, perdeu o namorado, o italiano Luigi Nemi,
em um acidente de mergulho no litoral paulista. Renata e Luigi moravam
juntos havia um mês. “Ainda não sei que conclusões estou tirando dessa
história, que me arrasou. Penso muito mais na fragilidade da vida, na
morte e, às vezes, penso que ele vai ser o forever young, o cara que
ficará sempre igual.” Em julho, ela incluiu uma menção a ele no cardápio
de sobremesas de seu restaurante, o Marakuthai, onde se lê: “Os doces
são uma homenagem a Luigi Maria Ucelli Di Nemi, que gostava de fazer
doces porque, ao ver as pessoas comendo, elas sorriam... A vida é curta,
comece pela sobremesa!”.
“As mulheres de 60 são as únicas a dizer: os homens não envelhecem melhor, não”, Mirian Goldenberg, antropóloga
Depois do drama, Renata entende
mais ainda que a vida depende do ângulo de visão. “Eu poderia ter me
afundado, mas tentei encarar de forma natural. Agora, fiquei mais
alerta, com mais medo. Ao mesmo tempo, comecei a entender que isso faz
parte da vida, que muitas pessoas morrem todos os dias.” É essa mesma
posição que ela decidiu adotar em relação ao envelhecimento: “Não tenho
como fugir. Basta aceitar”.
Acho importante estar bem consigo mesma. Uma boa aparência é fundamental, mas o conhecimento que vem com a idade não tem preço. O ideal, pra mim, é o meio termo: se sentir bem com a idade que temos e com a bagagem que construímos! Bjo Sil, adorei o post!
ResponderExcluirVerdade Lisiê. Como diz Roberto Crema - a negação da impermanência, da negação da morte é uma normose. Nós passamos como tudo que existe.Assim, juventude não é uma questão de idade cronológica: é um estar desperto,inteiro e afinado com a estação da existência. Obrigada por acompanhar sempre. Bjs!
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